O atual número 80 do Viaduto Dona Paulina era, no início do século XX, o terreno onde ficava a mansão de Paulina de Souza Queiroz, que foi desapropriada quando do primeiro projeto da Avenida Itororó, a atual Vinte e Três de Maio. (Não consegui achar fotos da mansão; alguém tem?) O decreto-lei 14.280, de 24 de dezembro de 1944, regulamentou a doação do terreno por parte do governo do estado, então gerido pelo interventor Fernando Costa, para o Instituto de Engenharia e o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp). O Ciesp era — e ainda é — a entidade irmã da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (para entender melhor a diferença entre as duas entidades, consulte as páginas 98 a 101 da dissertação de mestrado intitulada “A FIESP e o estado nacional: de escudeiros e opositores”, de Celio André Barbosa, publicada em 2009).
Ali seria erguido, a partir de 1946, o Palácio Mauá, que passaria a ser sede da Fiesp, da Ciesp e do Instituto de Engenharia. O presidente da Fiesp à época, Roberto Simonsen, é considerado o idealizador da construção do edifício de 21 andares (foto abaixo), que teria duas inaugurações: 11 de dezembro de 1952 e 25 de janeiro de 1955. Ele simbolizaria a “união” entre a indústria e os engenheiros. Já o nome do edifício era uma homenagem a Irineu Evangelista de Souza, o Visconde de Mauá — ele era também o Barão de Mauá, mas um dos nomes cogitados para o edifício originalmente era Edifício Visconde de Mauá. O projeto foi do arquiteto Francisco Prestes Maia, que tinha encerrado seu primeiro mandato à frente da prefeitura paulistana em 1945. A obra foi financiada pela Caixa Econômica Federal, com um empréstimo pago em “pouco mais de vinte anos”, segundo o engenheiro Leônidas Fagundes Rhormens, conhecido como Zico, um dos funcionários mais antigos do prédio em 1977, quando foi ouvido pela Folha de S. Paulo.
A Fiesp/Ciesp passou a funcionar no quinto e no sexto andares do Palácio Mauá, junto com o Instituto de Engenharia, que ocupava o oitavo e o nono andares. Os demais espaços eram alugados, e a renda era dividida entre as duas entidades. Aos poucos, entidades ligadas à Fiesp, como o Serviço Social da Indústria (Sesi), e sindicatos patronais da indústria começaram a alugar esses outros espaços. Em 1977 o Instituto reclamava do valor dos aluguéis, considerados por ele “ridículos, irrisórios e irreais”, segundo a Folha. Essa declaração foi publicada em matéria (“Um novo dono para o velho Palácio Mauá”, Folha de S. Paulo, 20 de novembro de 1977, página 24) que especulava sobre o destino do Palácio Mauá após a mudança da Fiesp para o número 1.313 da Avenida Paulista, em novembro daquele ano.
Como o novo edifício não comportaria todos os sindicatos que estavam instalados na sede antiga, a mudança da Fiesp não foi total. Também por esse motivo, ela não poderia de imediato vender a sua parte no Palácio Mauá, apesar de o Instituto ser o principal interessado na compra, para ampliar suas instalações e seguir alugando o que sobrasse, provavelmente por valores mais atualizados. Após a saída da Fiesp, o Instituto ficaria no Palácio Mauá até a decada de 1980, quando se mudou para o local atual, na Avenida Doutor Dante Pazzanese, 120, na Vila Mariana. O Palácio Mauá hoje é conhecido como Fórum Hely Lopes Meirelles.
O novo prédio da Fiesp foi erguido no terreno onde ficava o casarão de Fuad Salem, classificado pelo Jornal da Tarde em reportagem de abril de 1969 como “um dos mais belos e caros da [Avenida] Paulista”. A foto acima é da mansão, publicada na mesma reportagem. Quando ela foi publicada, o casarão e seu terreno de mil metros quadrados já haviam sido vendidos por nove milhões de cruzeiros, e o imóvel estava sendo demolido, com a venda de boa parte do material retirado, quase todo importado. A descrição do interior da mansão dá uma ideia do que se perdeu: “(…) o palacete [tinha] sessenta cômodos, vitrais de cristal belga, azulejos ingleses e alemães, e todo o mármore importado da Alemanha e de Portugal. O mármore está ainda na escada e nas colunas da entrada. Dois artistas orientais trabalharam três anos no piso da sala de música, que forma mosaicos de desenhos entalhados. A decoração das outras salas e janelas segue o estilo oriental, com reproduções de palmeiras, tamareiras e camelos.” A construção da casa, em 1924, custou cerca de mil contos de réis, uma fortuna para a época. E ela durou apenas 45 anos.
Em seu lugar, o Edifício Luís Eulálio de Bueno Vidigal Filho começou a ser construído em 1970, mas só seria definitivamente acabado em 1979, apesar de diversos departamentos da Fiesp já funcionarem ali desde 18 de novembro de 1977, quando foi realizada no novo prédio a cerimônia de posse da diretoria da Fiesp. Nessa época, a estrutura externa de um tom bem escuro de cinza, que dá a forma triangular às faces do edifício, ainda não tinha sido instalada. Assim, apesar de o prédio em si já ter um formato triangular devido às lajes, ele não se destacava muito na paisagem, ao contrário do que ocorre hoje, quando, mesmo de longe, ele chama a atenção:
A área no nível da Avenida Paulista é constantemente usada para exposições e apresentações. Cerca de uma década atrás, quando eu trabalhava na região — mais precisamente, em um prédio atrás do da Fiesp, na Alameda Santos —, costumeiramente havia filas no início da noite: eram pessoas em busca de ingressos, creio que gratuitos, para a apresentação teatral do dia. Naquela época, a Fiesp deixava seu corredor lateral na Alameda Santos aberto, e eu, assim como centenas de pessoas, usava-o para ter um acesso mais rápido à Estação Trianon-Masp do Metrô, sem precisar dar a volta pela Rua Pamplona. Quem acessava pela Alameda Santos tinha de subir uma escada de metal que beirava o lado direito do prédio (visto daquele lado), em seguida virar à esquerda para entrar no corredor central daquele andar (térreo?) e, ao final desse corredor, subir uma curta escada que termina na calçada da Avenida Paulista.
Há anos não vejo o acesso da Alameda Santos aberto. Acredito que não mais o abram, sabe-se lá por quê. Nunca o fotografei, mas certa vez, em 3 de novembro de 2003, passei por lá e notei a lua, brilhante no céu às 17h40. Fotografei-a; é a foto aqui embaixo. Nela pode-se ver parte do prédio da Fiesp à esquerda. Embaixo à direita, vê-se o muro do corredor, que divide o terreno da Fiesp do prédio de apartamentos vizinho na Alameda Santos. Mas a escadaria… dela não tenho fotos.
Hoje, o prédio da Fiesp faz parte da cultura popular, não apenas por ser constantemente reproduzido em imagens da Paulista, mas também por aproveitar suas formas para decorações inusitadas, como um videogame gigante, jogado ao vivo por voluntários postados do outro lado da avenida, em um estande instalado na Alameda Rio Claro. O jogo da foto abaixo era comemorativo da Copa do Mundo, e havia uma grande fila para quem quisesse subir no estande e participar, no último mês de abril.
Atualmente, o antigo prédio da FIESP abriga as Varas da Fazenda Pública da Justiça estadual.
Achei esse artigo no Facebook. A imagem da antiga residência. Linda por sinal. Talvez consiga falar com a autora da foto. Boa sorte.